Tragédia e amor: será?
Quando assistimos à tragédia dos outros, mesmo que fisicamente distantes, nos sentimos ao mesmo tempo entristecidos e imobilizados pela dor alheia. É preciso compreender a dor do próximo – ainda que não na sua plenitude, por não ser possível - para que não nos escondamos comodamente nesse alheamento tão comum que cada dia mais nos afasta do outro. Sintoma desse distanciamento é o individualismo exacerbado a transformar homens em icebergs, cujos corações são como blocos de gelo.
O mundo parece se transformar cada dia mais numa espécie de matrix, onde a realidade mais se parece com uma abstração. No entanto, ainda que aparentemente etérea, essa mesma realidade nos assalta abruptamente com a dor, quando somos atingidos pessoalmente ou assistimos aparentemente “incólumes” ao desespero dos que efetivamente são dilacerados insuportavelmente pelo sofrimento. De certa forma o gelo derrete e então as réstias nos atingem, como farpas, cortando profundamente a carne.
Não há como dimensionar o sofrimento dos pais que perderam seus filhos tão abrupta e violentamente nesse terrível atentado perpetrado contra crianças inocentes por um lunático no bairro pobre de Realengo no Rio de Janeiro. A dor deles passa a ser a nossa dor, por mais frios e desumanos que essa sociedade hipócrita possa ter nos tornado. Não mais será possível ou razoável, depois desse fato, o “levantar de ombros”, como se não fizéssemos parte do mesmo agrupamento humano que necessita de proteção. Nos sentimos engolfados, somos absorvidos por essa tsunami de dor, choro e lamentações. Despertamos da tranqüila passividade quando a violência ultrapassa o limite do aceitável: estamos bem despertos.
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Há um belíssimo discurso cristão que estamos sempre a observar por todos os lados – e inclusive somos participantes dele. Por aqui, neste mundinho ‘abstrato’ virtual, personalidades de todos os matizes pululam alegremente: uns que nada dizem, outros que muito dizem e pouco se aproveita; uns que dizem muito, mas nada amam; outros ainda que amam e pouco dizem. E há aqueles que dizem amar, sabem até dizer muito bem as coisas, mas o seu é um estranho amor cristão. Aliás, dizer bem nem sempre é salutar por si só, especialmente quando o discurso é vazio, por não se traduzir em ações para o crescimento do Reino. As palavras são belas, há profundidade no discurso; a construção estética é admirável, mas junto com tudo, há muita fúria, xingamento. O que mais se ouve é: tolo, estulto, imbecil, tonto, etc. É o "amor" traduzido cruamente em puro desprezo.
E há, por fim, os que amam de verdade, demonstrando esse amor cristão na sua conduta cotidiana, aqui mesmo, nesse mundo abstrato. Há muitas formas de reconhecê-los, dentre elas não se associam arrogância, histrionismo, gritaria, superioridade. Quero fazer parte deste seleto grupo, deixando de lado a truculência nas palavras, adquirindo mansidão e aprendendo a ouvir. Asseguro que estou percorrendo a “trilha”, em lento processo de aprendizado.
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Em momentos como o que agora estamos vivendo, quando a loucura bate às portas de tantas famílias ceifando seus filhos, concluo que é mesmo preciso aprender a amar, tal como Cristo ensinou. Necessitamos fazer do amor mandamento perpétuo, olhando para os nossos semelhantes com afeição genuína. Mister que façamos a tradução do discurso em ações diárias, sob pena de as palavras se diluírem ao vento, perdendo-se nas brumas de uma existência hipócrita e sem significado. Verdadeiramente há culpa em nossos olhos, quando as lágrimas de outros tantos olhos vertem a sua dor incontida e contínua. A reflexão tem lugar, Cristo diz para que estendamos as nossas mãos para o próximo, mesmo que seja para chorar com ele, dividir a dor.
Amor e tragédia se encontram. E então, ao final, dirigimos as nossas preces ao Criador glorificando e dizendo: faça-me entender que o Senhor deu, o Senhor tirou. Bendito seja o nome do SENHOR!
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