terça-feira, 30 de novembro de 2010

Calma: conselheira dos sábios




Houve uma vez, há alguns anos, que participei de um julgamento pelo Tribunal do Juri, na qualidade de advogado de defesa. Terminado o julgamento, nem a minha tese e nem a do Ministério Público foram inteiramente vitoriosas, posto que, enquanto eu defendia a absolvição do acusado, o Promotor de Justiça lutava pelo seu libelo , pela condenação, por homicídio duplamente qualificado. Por que não houve vitória para qualquer dos lados? Porque houve condenação por excesso culposo. Essa figura jurídica, grosso modo, se caracteriza pelo uso excessivo da legítima defesa. Vale dizer que o sujeito está com a razão, mas usa de força desproporcional no intuito de se defender. É mais ou menos por aí.

A lembrança do fato jurídico me veio ainda hoje, ao ler um post muito bem escrito, refutando um outro. Acompanho o raciocínio do articulista, dou-lhe inteira razão quanto ao conteúdo e fundamentos do escrito, mas discordo do tom. Seria perfeito se o tom fosse menos belicoso. Reafirmo que a hostilidade gratuita, desnecessária, enfraquece os fundamentos do escrito, ainda que não possa ser considerado ofensivo.

Discordo dessa conversa tão em voga nos meios acadêmico-teológicos, especialmente usada por intelectuais belicosos, no sentido de que na argumentação tudo é permitido, desde que circunscrito a certos aspectos morais e éticos. Antes que me acusem de defender uma falsa camaradagem cristã, falsa humildade ou falsa piedade, quero me antecipar aos supostos detratores afirmando veementemente que não! Acredito que a verdade pode e deve conviver bem com a boa educação, com a civilidade e com o respeito ao próximo, especialmente com os domésticos da fé.

Começo a sentir "urticária" logo que vejo uma pretensa casta a se afirmar em tudo. Na superfície, eles defendem a completa liberdade de expressão e crítica, porém, os seus argumentos são sempre irrefutáveis... Como que se arrogam a donos da verdade, já que todo e qualquer argumento contrário tecido contra aquela postura é reputado como nada!

É, de tudo isso também me canso.

Confesso que sou avesso a grupelhos. Mesmo cristãos, quando se unem em "pacto de mútua proteção", tornam-se cansativos e pretensiosos.

Penso ser possível e salutar refutar o interlocutor com uma certa sobriedade, mais ainda quando se trata de um irmão cristão. A truculência, ainda que respaldada em argumentação bem elaborada , continua nociva ao desenvolvimento do diálogo. E não perde aquele caráter de truculência.

Obviamente que não defendo a hipocrisia disfarçada de amor cristão como obstáculo à defesa da Verdade escriturística. Isso é balela, falácia de fraudadores! Assim como também me posto diametralmente contra o endurecimento gratuito, a palavra desnecessariamente rigorosa, a dureza excessiva. O que se ganha com isso entre cristãos? Onde levará essa disputa?

Amedrontam-me os que citam as palavras de Jesus contra os fariseus para justificar o seu tom, qualquer que seja. Acho a postura no mínimo temerária. O contexto em que Jesus disse aquelas duras palavras (raça de víboras) pode não se aplicar ao exemplo citado, tampouco os autores se confundem...

O certo é que por vezes todos nós erramos, seja na argumentação ou no tom. A crítica é salutar, desde que postada nos limites do respeito e da civilidade - e do amor cristão, por que não?


9 comentários:

Robson Aguiar disse...

A crítica por crítica não é bem vinda em nenhum lugar. Acho que devemos sempre estar imbuído do amor como introdução as nossas críticas. Percebo sua responsabilidade quando usa as letras para ponderar as grosserias que por vezes afloram na blogosfera cristã. Em parte concordo com o irmão e acho pertinente vossa colocação. Como costumo visitar seu blog, não pude deixar de ler sua boa matéria.

Quero tão somente registrar os meus parabéns por sua imparcialidade e maneira equilibrada como desenvolveu o assunto.

Sei também que por vezes pareço um tanto belicoso, deve ser por que em meu trabalho sou obrigado a usar tal ferramenta, se é que se pode chamá-la de ferramenta. Mas, pessoalmente sou bem tranqüilo.

No entanto, recebo seus conselhos com CALMA, risos. Sua serenidade está estampada em seu texto.

Jorge Fernandes Isah disse...

Ricardo,

excelente e equilibrado texto.

De minha parte, não entro em "bate-boca", mesmo que seja com o aparente intuito de esclarecer verdades bíblicas. Demorei a perceber que a discussão tende apenas a polarizar as partes, e de valia nenhuma tem a não ser exercitar o ego e a soberba. Eu mesmo afaguei o meu por muito tempo.

Converso com amigos ou com quem deseja o diálogo, não o convencimento à força. Por exemplo, entre nós dois há pontos discordantes, mas jamais faltou-nos respeito, ou saber o momento certo de parar, para não virarmos dois "esmurradores de caráter".

Também, não estou dizendo para que os "lutadores" não lutem, é problema deles com seus oponentes, e Deus. Não tenho de me meter. Acontece que normalmente os mesmos que gritar "AMOR, AMOR!" são exatamente os que menos o demonstram. Usam-no como uma máscara para encobrir seus verdadeiros intentos. Da mesma forma, o debate esconde uma boa dose de vaidade, se não tiver, no íntimo, o desejo sincero de ensinar e aprender, exortar e ser exortado.

Por isso, cada vez menos visito sites e blogs cristãos [os incrédulos, há muito já não o faço], restringindo-me a um número menor do que dez, se muito. Pouca coisa boa se aproveita, e muito da carnalidade se visualiza.

No mais, que Cristo tenha misercórdia de todos nós, e perdoe-nos por blasfemar seu nome entre os "gentios".

Grande abraço!

Fica na paz, meu irmão!

Ricardo Mamedes disse...

Caro Robson,

É um prazer tê-lo por aqui, e prazer maior ainda saber que você lê este pequeno blog.

Quero que saiba que o meu texto serve também como auto-crítica, pois eu também já errei várias vezes - e ainda erro - seja no argumento ou no tom. A questão é reconhecer, aceitar e mudar. Uns não mudam, pois jamais se reconhecem em erro, ainda que suas palavras digam que sim.

A serenidade deve ser buscada sempre, e sei que nem sempre conseguimos alcançá-la. Por isso deve ser um exercício diário. O verdadeiro cristianismo nos leva à esta busca e a este exercício diuturno.

Grande abraço e obrigado pela visita.

Ricardo.

Ricardo Mamedes disse...

Jorge,

O seu comentário é sábio, demonstrando um caráter transformado, uma natureza modificada, em busca da verdadeira e completa redenção.

Sim, é a grande batalha de egos! Os gladiadores com as suas espadas desembainhadas! Salve-se quem puder! Como eu afirmei no texto, ainda que com a razão, eles precisam se afirmar contra o oponente, não somente "vencendo", mas aniquilando o "adversário". Nesse momento o irmão se torna "o fariseu", "o ímpio", "o incrédulo", etc. A casta se transforma em árbitro de tudo e de todos; a sua palavra é lei, os seus "estatutos" devem ser prontamente obedecidos.

Tal como disse outrora, eu me vejo mais nas pessoas falhas, mas que tentam acertar. Quero me espelhar cada vez menos nos detentores da verdade, da extrema sabedoria - pois pode ser que tais qualidades somente estão a refletir o seu inflado ego. Quanto a vaidade, basta a minha, que luto constantemente para manter sob controle - e nem sempre conseguindo.

Tal como você, visito pouquíssimos blogs, e muitos que eu visitava diuturnamente outrora, já não mais é assim. Pode ser até que eles estejam ganhando com a minha ausência, ou pode ser que não.

Grande abraço!

Ricardo.

Esli Soares disse...

Ricardo,

Excelente texto, outra vez! O que mais dizer? Acho que tudo o que tenho feito aqui (na blogsfera), fala por si só. Assim só posso mesmo é mais uma vez assinar em baixo...

Esli Soares

Ricardo Mamedes disse...

Esli,

É isso mesmo, cada um com a sua responsabilidade, sabendo admoestar e exortar sem a necessidade de ser sempre o árbitro, com poderes de plenipotenciário.

Obrigado pela visita.

Abraços.

Regina Farias disse...

Ricardo,

Hostilidade, eis a questão.
Não há nenhuma necessidade dela.

Dá perfeitamente para se discordar, criticar e ser "do contra" com leveza, firmeza e bom humor muito bem dosados. O que denota respeito e consideração pelo meu interlocutor que pensa e age diferente do meu modo de ser e ver a vida.

Parafraseando Paulo, que o árbitro do nosso coração seja a paz de Deus, não aquela dita mecanicamente em saudações, mas a paz que Ele instalou no nosso ser para que exercitemos nossa compaixão nesse planeta cheio de diversidade.

Abs,

Rê.

Ricardo Mamedes disse...

Regina,

É exatamente isso! Há a possibilidade de se discordar de alguém sem aquela agressividade eloquente, sem ser hostil. Mas há aqueles que preferem ter o perfil menos cristão e muito mais contestador. Embora também seja possível ser contestador e cristão.

Obrigado mais uma vez pela visita e comentário.

Ricardo.

Ricardo Mamedes disse...

Pr. Anselmo,

Obrigado pela visita e que Deus igualmente o abençoe!

Ricardo.

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